Aquela

28-04-2017

 O meu salto tem 15 cm, o meu copo está raso de whisky e os meus lábios cor de sangue.

 A mente? Essa está cheia de tudo.

 Observo a vida como quem nada experimentou dela. Tola... pois já experimentei demasiado. Ainda assim nada me chega, falta-me sempre alguma coisa. Sonho demasiado, quero demasiado e sou demasiado.

 Sou obstinada, gosto do risco, gosto de tudo por inteiro e em pleno.

 Gosto da diferença e de quem tem competência para a fazer.

 Não gosto de pessoas banais com comportamentos monótonos.

 Gosto que me notem, que me olhem além do que os olhos vêm. Gosto de perder tempo em olhares e em silêncios.

 Não temo entrar em lugar nenhum sozinha. Não receio o que dizem, sei bem o que sou.

 Sou de cara e alma trancada, poucos têm a chave.

 E de vez enquanto, lá mudo eu as fechaduras, como quem limpa a casa dos maus agoiros.

 Talvez eu seja assustadora, talvez seja bastante fria, talvez as minhas palavras sejam poucas. Mas uma coisa é certa, cada um tem de nós o que cativa, e se eu não dou mais de mim, é porque estás a desempenhar o teu papel erradamente.

 Sou entardecida, não gosto de pessoas precoces. Gosto de quem voa mas sempre sabe aterrar. De quem sabe o que é viver, de quem sabe cuidar de uma mulher em todas as divisões da casa !

 De quem sabe realmente ser a diferença. Gosto de homens feitos e bem aprendidos. Gosto de ser eu, gosto de mim ! De me amar, de me mimar, de fazer aquilo que me apetece quando me apetece, de falar de tudo que sei, sem medo de represálias. Gosto de trabalhar, ter as mãos cheias de terra, assim como gosto do meu vestido e saltos pretos, acompanhados de um batom vermelho e uma bebida forte na mão.

 Sou uma mulher sem medo, e se isso te assusta. Bem, se isso te assusta ainda precisas de mais uns anos, mais uns anos de tudo que a vida ensina. Mais uns anos de cabeçadas na parede. Mais uns anos a dares a mão a solidão e aprender a conviver com ela.

 E aí, vais notar que nesta vida, ou aprendes a ser sozinho ou acabas sempre a lamentar a perda de quem não soube ser alguma coisa. Aí, vais entender porque sou tão fria, porque entro sempre sozinha em casa, no carro e na discoteca. Vais entender, porque seguro o meu copo sozinha, observando os de mais, vais entender que de mim não há mais nada, a não ser nada.

 Dei tanto de mim, que me tornei vazia. Às vezes parece que ainda sobrou alguma coisa, mas é só um leve desejo de que realmente tivesse sobrado.

 E assim fiquei eu, a mulher que gosta de usar preto, do salto mais alto e da bebida mais forte. Assim sou eu, a mulher de carácter forte, obstinada, que gosta de estar calada, sem rir, sem falar, só a olhar sem medo.

 Esta sou eu, que tu achaste tão pouco, só porque não soubeste ser nada !

 Sou eu, que lamento todos os ineptos que me julgam pela minha aparência, que não me sabem ver, nem ler.

 Eu, que me canso rápido do fracasso, do pouco, da incerteza e de tudo que seja a baixo do que mereço.

 Eu, que exijo sempre, pelo menos, uma igualdade.

 Fiquei assim, sou assim, serei assim... mas com certeza, que sei quem sou, o que quero, o que pretendo. Sem nunca me desviar, sem nunca mudar, sem nunca enganar ninguém, com falsas faces, que não as tenho.

 Sou complicada, dou trabalho, faço cara feia mesmo e tenho sempre a resposta na ponta da língua, mas também já não perco o meu tempo com qualquer coisa, só com o que vale a pena, e pouco.

 Eu sou eu, não sei ser mais ninguém, e pouco me importa que não gostem.

 Antes de aprender a ser com alguém, aprendi a ser sozinha.

 E isso não me assusta, sossega.

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